Ilustração do motor a ar quente original de Stirling - fonte Scienzia Systems |
Nascido algum tempo depois e em pleno domínio da máquina a vapor como força motriz da Revolução Industrial, o motor Stirling é um motor de combustão externa que apesar de nunca ter suplantado a máquina a vapor, nem os motores de combustão interna, continuou despertando grande interesse até os dias atuais, devido a inúmeras vantagens competitivas para algumas aplicações. Sua patente foi registrada pelo reverendo escocês Robert Stirling em 1816. Segundo algumas publicações, a motivação de Stirling para o desenvolvimento do motor que leva seu nome teria sido a preocupação com os constantes acidentes provocados por rompimentos de tubos e explosões de caldeiras a vapor, que
faziam muitas vítimas. Devido as limitações da metalurgia empregada na época, tubos, soldas e chapas frequentemente se rompiam quando submetidos a pressão de trabalho do vapor. O sofrimento das vítimas e o grande números de mortes decorrentes teria sensibilizado o reverendo a desenvolver uma força motriz mais segura.
O motor Stirling não foi concebido como algo inédito, mas, como um melhoramento dos primeiros motores de ar quente. A primeira patente de George Stirling foi registrada como motor a ar quente com dispositivo "economizador", deixando claro que o conceito de um motor que funcionasse a ar quente não era algo desconhecido. Também, existem citações na literatura de que, em 1699, Guillaume Amontons tinha tal proposta. Ainda são citadas outras que teriam sido manifestadas em anos posteriores; Reverendo Henry Wood vigário do condado de Shropshire, no ano de 1759, e Thomas Meade, um engenheiro do condado de Yorkshire de Sculcoats.
Motor a ar quente de Sir George Cayley de 1807 fonte George Caylay |
Entretanto, o primeiro motor a ar quente, com com amplo registro na literatura, foi o motor concebido por Sir George Cayley. Há uma publicação sua, com desenho esquemático de seu motor a ar quente, no Nicholsons Jornal, do condado da Inglaterra, no ano de 1807. Aliás, nesse texto fica evidenciado que os motores a ar quente genéricos já existiam há um bom tempo na Inglaterra. O motor proposto por Cayley era um motor de ciclo aberto, ou seja a cada ciclo o ar do interior dos cilindros era renovado. Certamente também devem ter sido os anteriores, dos quais não parece haver muitos registros descritivos. Esse arranjo era causa de baixo rendimento dos motores a ar quente, já que boa parte do calor era desperdiçado através da descarga dos gases para a atmosfera no final de cada ciclo.
Desenho, a mão, do primeiro motor Stirling patenteado em 1816 - fonte Stirling Engine |
Já o desenho do motor de George Stirling de 1816 mostra um motor de ciclo
fechado com trocador de calor, modernamente chamado de regenerador, elemento padrão nos motores
Stirling atuais.
O primeiro motor Stirling de uso prático foi construido por ele em 1818 e instalado numa pedreira para bombear água. Em 1820, Stirling juntou-se ao seu irmão mais novo James no aperfeiçoamento de seu invento. Foi de James, que era engenheiro, a sugestão de aumentar a pressão interna do motor de modo que trabalhasse a pressões superiores a pressão atmosférica objetivando níveis de potência de saída mais elevados. Esse melhoramento teve grande importância por ter elevado consideravelmente o rendimento dos motores a ar quente.
Os irmãos obtiveram patentes para melhoramentos conceituais nos motores a ar nos anos de 1827 e 1840. Com isso criaram na verdade um novo ciclo para motores a ar quente, explicado teoricamente pelo Professor Quorne Rankine em 1850. Quase um século depois, o termo “Motores de Stirling” passou a generalizar todos os tipos motores térmicos regenerativos de circuito fechado a ar ou gás com aquecimento externo.
Os irmãos obtiveram patentes para melhoramentos conceituais nos motores a ar nos anos de 1827 e 1840. Com isso criaram na verdade um novo ciclo para motores a ar quente, explicado teoricamente pelo Professor Quorne Rankine em 1850. Quase um século depois, o termo “Motores de Stirling” passou a generalizar todos os tipos motores térmicos regenerativos de circuito fechado a ar ou gás com aquecimento externo.
A trajetória do sucesso dos motores Stirling foi sempre marginal quando comparada com a dos motores a vapor, de combustão interna ou elétricos. Quando seu principal concorrente foi a máquina a vapor, as vantagens de não estar propenso a explosões, possuir instalações mais simples e com menos órgãos acessórios não foi suficiente para suplantar suas deficiências em comparação ao concorrente. Muitas de suas desvantagens comparativas se deviam as limitações do estado de arte da metalurgia da época. Durante o primeiro século de vida o motor Stirling nunca se aproximou do rendimento teórico prometido - apontado como o mais alto entre as máquinas térmicas - pois, os processos de fabricação e os lubrificantes da época não permitiam a produção de uma unidade hermética que trabalhasse com alta pressão interna, essencial para se alcançar altos rendimentos.
Por outro lado, a necessidade de auxílio na partida e uma curva de torque plana e de baixo valor não habilitava o motor Stirling a lidar com trabalhos onde houvesse variação de carga. Ao passo que sua principal concorrente, a máquina a vapor, esbanjava torque de partida e lidava muito bem com as altas variações de carga e velocidade exigidas pela maioria das aplicações da época. Nesse cenário o motor Stirling ou mesmos outros motores a ar quente só encontraram aplicação em alguns nichos, em aplicações de pouca importância como pequenas estações de bombeamento de água e ventiladores. Alguns desses ainda sobrevivem ao tempo de mais de um século de existência.
Moto bomba de Ericsson, mais de três mil unidade vendidas em três anos - fonte Genuine Ideas |
Ainda no século XIX os motores a ar quente tiveram um grande empreendedor, John Ericsson, um Sueco que veio a se estabelecer na Inglaterra em 1826 e depois nos Estados Unidos, por volta de 1840. Entre os anos de 1855 e 1858, Ericsson conseguiu relativo sucesso fabricando unidades de bombeamento movidas por um motor a ar quente de desenho próprio, mas de funcionamento similar ao de Stirling. Algumas fontes apontam que Ericsson conseguiu vender em solo americano mais de 3 mil unidades naquele triênio. As bombas de Ericsson também foram fabricadas sob licença e vendidas principalmente na Inglaterra, mas também em outros países da Europa. Na Inglaterra, os motores de Ericsson encontraram outros competidores no mesmo nicho, sendo o principal os motores a ar quente Robinson que, igualmente, se tornaram um tanto populares como unidades de bombeamento de baixa potência.
Antes do sucesso com as moto bombas a ar quente, por volta de 1853, Ericsson chegou a montar grandes unidades de seus motores a ar quente em um navio, mas seu experimento fracassou por falta de potência suficiente, apesar das dimensões avantajadas dos quatro motores montados na embarcação.
Antes do sucesso com as moto bombas a ar quente, por volta de 1853, Ericsson chegou a montar grandes unidades de seus motores a ar quente em um navio, mas seu experimento fracassou por falta de potência suficiente, apesar das dimensões avantajadas dos quatro motores montados na embarcação.
Ilustração do navio de Ericsson quando potenciado por quatro de seus motores a ar quente, um experimento fracassado - fonte Genuine Ideas |
Se a competição com a máquina a vapor, deixou o motor Stirling relegado a aplicações marginais, o aparecimento e rápido desenvolvimento dos motores a combustão interna recrudesceram ainda mais ainda mais a concorrência, estreitando em muito os nichos de aplicação para o motor Stirling. Isso não quer dizer que ele foi esquecido, pois suas vantagens teóricas eram bem superiores ao que sua aplicação prática havia mostrado. A evolução tecnológica trouxe refinamentos nos meios de produção que aproximaram o rendimento de motores experimentais ao apontado pelo ciclo teórico. O interesse pela energia térmico solar mostrou que o motor Stirling poderia ser a melhor alternativa para produção de eletricidade com a aplicação de motores de pistão livre acoplados a geradores lineares.
Entre os anos de 1950 e 1980 a Philips chegou a desenvolver unidades desse tipo que alcançaram um rendimento térmico global da ordem de 45%, um dos mais altos entre as máquinas térmicas. Grande parte das usinas termo solares em funcionamento utilizam motores Stirling de pistão livre montados em concentradores parabólicos.
A nível experimental, entre as décadas de 1970 e 1980, a Nasa desenvolveu um motor Stirling automotivo que foi aplicado a vários modelos comercias de fabricantes Americanos que tiveram seus motores convencionais substituídos pelo Stirling. Há um vídeo no YouTube que ilustra bem a dimensão desse programa. As conhecidas vantagens como a ampla gama de multicombustíveis que podem ser utilizados, reduzido número de peças e acessórios, baixa emissão de poluentes devido a queima completa e alto rendimento térmico são bastante ressaltadas. Entretanto sabe-se que existem alguns problemas intrínsecos que dificultam esse tipo de aplicação como a lenta resposta às mudanças de regime em comparação aos motores de combustão externa e o tempo requerido para o motor entrar em plena operação, apesar de minimizados não parecem ter sido solucionados.
Nos últimos anos, com a volta do interesse pelo carro elétrico algumas empresas voltaram a cogitar a utilização do motor Stirling de pequeno porte para geração de energia onboard, seja para alimentar equipamentos de conforto e grande consumo como ar-condicionado ou para estender a autonomia desses veículos através da recarga direta da bateria. Esse uso, a priori, se mostra muito mais adequado às características do motor Stirling.
Uma outra curiosidade do ciclo de Stirling é que ele pode ser utilizado de maneira reversa, ou seja uma máquina obedecendo esse ciclo pode ser utilizada para refrigerar ao invés de produzir potência. Isso foi percebido ainda no ano de 1847 por Sir William Thomson. Atualmente unidades de refrigeração obedecendo o ciclo de Stirling são produzidas em escala para atender as indústrias de liquefação de ar e nitrogênio.
Motores Stirling automotivos - programa da NASA
Entre os anos de 1950 e 1980 a Philips chegou a desenvolver unidades desse tipo que alcançaram um rendimento térmico global da ordem de 45%, um dos mais altos entre as máquinas térmicas. Grande parte das usinas termo solares em funcionamento utilizam motores Stirling de pistão livre montados em concentradores parabólicos.
Motor Stirling desenvolvido pela NASA para veículos automotivos em extenso programa de testes - Fonte: A-body |
A nível experimental, entre as décadas de 1970 e 1980, a Nasa desenvolveu um motor Stirling automotivo que foi aplicado a vários modelos comercias de fabricantes Americanos que tiveram seus motores convencionais substituídos pelo Stirling. Há um vídeo no YouTube que ilustra bem a dimensão desse programa. As conhecidas vantagens como a ampla gama de multicombustíveis que podem ser utilizados, reduzido número de peças e acessórios, baixa emissão de poluentes devido a queima completa e alto rendimento térmico são bastante ressaltadas. Entretanto sabe-se que existem alguns problemas intrínsecos que dificultam esse tipo de aplicação como a lenta resposta às mudanças de regime em comparação aos motores de combustão externa e o tempo requerido para o motor entrar em plena operação, apesar de minimizados não parecem ter sido solucionados.
Nos últimos anos, com a volta do interesse pelo carro elétrico algumas empresas voltaram a cogitar a utilização do motor Stirling de pequeno porte para geração de energia onboard, seja para alimentar equipamentos de conforto e grande consumo como ar-condicionado ou para estender a autonomia desses veículos através da recarga direta da bateria. Esse uso, a priori, se mostra muito mais adequado às características do motor Stirling.
Uma outra curiosidade do ciclo de Stirling é que ele pode ser utilizado de maneira reversa, ou seja uma máquina obedecendo esse ciclo pode ser utilizada para refrigerar ao invés de produzir potência. Isso foi percebido ainda no ano de 1847 por Sir William Thomson. Atualmente unidades de refrigeração obedecendo o ciclo de Stirling são produzidas em escala para atender as indústrias de liquefação de ar e nitrogênio.
VÍDEOS SOBRE O ASSUNTO DISPONÍVEIS NO YOUTUBE
Bomba a ar quente do final do século XIX
Réplica moderna do motor Robinson
Ventilador antigo potenciado por motor Stirling
Motor Stirling didático alimentado pelo calor da mão
Usina termo solar moderna - motor Stirling de pistão livre com gerador linear
Montagem didática - Motor Stirling montado num concentrador solar.
Um resumo muito útil para uma rápida apresentação do motor stirling ilustra muito bem esse tipo de aplicação térmica que ainda pode ser muito utilizado para aproveitamento de energia térmica antes desprezada.
ResponderExcluirFantástica a sensibilidade ao calor da mão, movendo o êmbolo que transforma o movimento retilínio em circular. A intermitência é devido a variação da temperatura pela aproximação e distanciamento da mão, da placa, ou pela inércia tendo começado o movimento? Gostei muito da matéria recebida, pois, eu não conhecia esse tipo de motor. Muito obrigado, Daunar. Grande abraço!
ResponderExcluirEsqueci de me identificar no comentário de 07/06/2022. Sou: Jorge de Azevedo Pires - jorpires62@gmail.com
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